Por Adriano Silva
Houve uma época em que eu era mais agressivo. Cuidava menos dos outros e cuidava mais de mim. Era mais leal aos meus próprios sentimentos. Isto me tornava um cara mais áspero, mais cortante. Me adaptava menos aos ambientes: as pessoas que me recebessem em suas vidas do jeito que eu era. Não sei exatamente quando a chave virou para mim. Lembro de uma namorada, no comecinho da vida adulta, a quem eu admirava muito intelectualmente, fazendo um paralelo entre mim e um amigo nosso: "você tem muito menos dúvidas a seu respeito. Ele se questiona mais". E isso era um elogio ao cara, não a mim. Lembro de minha avó me dizendo, alguns anos antes, que muitas vezes não sabia o lado de chegar em mim, de me abordar para dizer alguma coisa. Cito esses dois marcos porque me ocorrem agora, ao pensar sobre o assunto. Então, psicanaliticamente, devem ter algum valor.
O certo é que houve um momento em que eu decidi que talvez estivesse mesmo muito expansivo, muito pontudo. Admiti a minha presença como algo excessivo e resolvi me apequenar para caber no mundo. Talvez isso tenha me tornado mais palatável, mais agradável aos outros. Mas é bem possível também que meu carisma e meu brilho pessoal tenham decaído na mesma medida. Talvez o meu processo de contrição pessoal em nome de ser melhor aceito ou mais amado pelas pessoas tenha estacionado lá atrás, naqueles anos em que você sai da faculdade se considerando um gênio e entra no mercado de trabalho se descobrindo apenas mais um a ajoelhar no milho corporativo. Ou talvez esse processo tenha avançado lenta e perigosamente através dos anos, me tornando cada vez mais dócil aos desejos dos outros e cada vez mais insensível às minhas próprias demandas. O fato é que muitas vezes me pego perguntando: o que eu quero? Não minha família, meus sócios, meus clientes. Não meus filhos, minha mulher, meus patrões, meus funcionários. Mas eu. O que eu quero? Nesses momentos percebo o número de vezes em que me encontro apartado de mim mesmo, vivendo uma vida definida pelas circunstâncias, por fatores externos, pelas expectativas dos outros, e não por mim.
Mas também há um tanto de sabedoria nesse processo que me tornou um cara mais manso. Ser alguém que ocupa espaços ao redor, invadindo o território alheio, é ser alguém incômodo. Falar muito e ouvir pouco tende a ser sempre pior do que falar pouco e ouvir muito. Então acho que há boa dose de maturidade nesse funcionamento de estar sempre disposto a rever meus pontos-de-vista, de sempre considerar que o outro pode estar certo. Acho que isso é aprendizagem de vida. Ainda que às vezes exagere, e o faça muito mais do que a média das pessoas. Ainda que isso me enfraqueça em vários momentos.
É claro que ser alguém extrovertido, ser uma pessoa que não se restringe previamente, muitas vezes significa ser alguém mais em paz consigo mesmo, ser alguém mais bem resolvido. Por outro lado, quem vai sempre na jugular no interlocutor, quem considera que o ataque é a melhor defesa, e não arreda o pé um centímetro das suas posições, também pode viver uma vida agastada, amargurada, exatamente por conta das vitórias que impõe ao mundo em volta, à custa de sopapos e nocautes.
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