quinta-feira, 18 de setembro de 2008

CARTA PUBLICADA POR UM "PASTOR"

"Prefiro não me identificar. Quero que me chamem apenas de pastor evangélico. As razões para não declinar meu nome são muitas. Talvez a principal delas seja a minha necessidade de desabafar, abrir o meu coração.

Para ser pastor hoje, já não basta ser piedoso, íntegro e terno de coração.

Necessito também ser empresário. Sei que os pastores de antigamente gastavam muito tempo orando, jejuando e buscando direção de Deus para suas comunidades. Eu, pelo contrário, sinto-me forçado a montar um bom departamento de relações públicas. Reuno-me regularmente com um grupo de trabalho para traçar estratégias. Não sei quantas horas já gastei nas salas de espera das emissoras de rádio e de televisão. Negocio bons horários

para que o nome de nossa igreja permaneça visível. Já me alertaram para o fato de que o meio acaba definindo a mensagem. Participei de um encontro de reflexão em que um palestrante nos advertiu que esse fascínio pela mídia vai acabar esvaziando os conteúdos de nossa pregação. "A televisão" - fomos advertidos - "não cobra um preço muito alto só em dinheiro, mas em relevância". Ouvi que a televisão não permite, por ser um veículo de entretenimento, que se reflita com profundidade sobre nenhum assunto. Concordei, mas entendo que estamos numa corrida de sobrevivência e se o nome de nossa igreja não ficar conhecido, continuaremos obscuros e pequenos.

Admito que a maioria dos programas de televisão evangélicos não se preocupa muito com aquilo que entendíamos ser a legítima exposição da Palavra de Deus. Quando não fazem propaganda da igreja, anunciam uma mensagem muito açucarada, só prometendo prosperidade, cura ou alívio para os sofrimentos.

Há mais no evangelho, mas temos de nos conformar com os tempos, acho! Sinto saudade daquela antiga pregação do evangelho sobre o pecado, arrependimento, o poder da cruz em salvar o pecador, o discipulado cristão e a esperança do retorno de Cristo. Por outro lado, quando me levanto em meu púlpito para pregar, sei que meu auditório está cada vez mais analfabeto em Bíblia. Minhas reflexões caracterizam-se pela superficialidade, pois as pessoas dos dias de hoje não aceitam muitas exigências. Já risquei de meu vocabulário todas expressões que possam ferir as suscetibilidades. Já não falo muito em temas como: negar a si mesmo e tomar a cruz; crucificar o velho homem com suas paixões, sofrer por amor a Cristo. Faz anos que não ouço mensagem sobre os caminhos estreito e largo. Gosto de procurar em livros de auto-ajuda mensagens que estimulem as pessoas a se sentirem de bem com a vida. Especializei-me em ensinar a orar reivindicando os nossos direitos de filhos de Deus.

Nossa igreja sabe desfazer maldições espirituais. Sei que não há muitos desdobramentos em repetir slogans religiosos, mas o clima do culto fica eletrizante. Se as pessoas não praticam o evangelho em suas vidas é problema delas; para mim, basta que nossos cultos sejam uma festa.

Perturba-me esse entra-e-sai de gente em nossa comunidade. As pessoas parecem não ter raízes. Disseram-me que nós, os pastores, somos responsáveis por criar consumidores de religião e, não, comunidades. Que mal pode haver

se as pessoas procuram um bom programa religioso, boa musica, ambiente confortável? Não aceito que minha preocupação de entreter (alguns jovens chamam de paparicar) meu auditório, em vez de me esforçar em formar neles o caráter de Cristo e os valores do reino, sejam a causa de tanta mobilidade.

Recuso-me a esvaziar minha platéia propondo solidez de princípios. Do jeito que vimos fazendo, a casa está lotada. Com cadeiras vazias, quem paga minhas contas? Chega de purismos. O espírito de nossa época é mesmo de pouca

fidelidade. Pra que tentar lutar contra as tendências de uma geração?

Darei o que as pessoas querem. Resolvi. Convidarei bons cantores, bandas que estejam movimentando as multidões; trarei pessoas com testemunhos de impacto; freqüentarei os movimentos de maior badalação para saber quem é quem no mundo evangélico. Darei uma cara nova aos nossos cultos.

Construirei uma mega-igreja. Quem tem mais gente pode mais no mundo religioso.

Conheci alguns pastores que viveram uma espiritualidade diferente, mas a geração deles está passando. Resta um remanescente de homens piedosos, creio que em extinção. O perfil do pastor de hoje evoluiu muito. Somos muito

mais aguerridos, mais intrépidos. Os resultados são visíveis. O discurso

piedoso desses homens conseguiu ganhar apenas 1% da população brasileira em quase 100 anos de evangelização. Minha geração aumentou esse número para 10%.

Admito que esses números não refletem mudanças no analfabetismo, na violência urbana nem nas perversas injustiças sociais. Contudo, quando anularmos o poder dos demônios que dominam determinadas regiões do país e com nossa nova palavra de ordem - "O Brasil é do Senhor Jesus! Povo de Deus, declare isso" -, reverteremos esse descompasso.

Ando triste e cansado. Alguma coisa me rasga por dentro. Não entendo porque me dou tanto e continuo tão arrasado. Agora você entende porque preferi não dizer o meu nome. "

 

Fonte: http://www.tvnetribeirao.com/cartadeumpastor.html

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