sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Encerrando mais uma etapa

Dada nossa  finitude,  característica determinada pelo Criador por causa da nossa queda, Ele,  clemente e amoroso como sempre, determinou também que viveríamos em etapas, a primária delas o nascer e morrer das células de nosso corpo, além da ciranda da Terra em torno do Sol, o mais majestoso, talvez, dos ciclos.

 

Ele estabeleceu também que haveria tempo para tudo:

 

Há tempo de nascer, e tempo de morrer;

Tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou;

Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar;

Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar;

Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;

Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora;

Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar;

Tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz.

Eclesiastes 3:2-8

 

Entre a noite de amanhã e a manhã de domingo próximo não existe nada e ao mesmo tempo existe tudo. Nesse escasso período de tempo estão nossas esperanças, nossas dúvidas, inquietudes, e desse elo cíclico depende nossa vida toda. Não nos é dado saber o que virá, e nossa memória seletiva e frágil logo se esquecerá de 2011.

 

Desejo que você viva plenamente esse novo ciclo, aproveitando as lições do que se finda. Mas não se esqueça de ser grato Àquele que amorosamente planejou todos os ciclos de sua vida, quando nem um deles havia ainda (Os teus olhos viram o meu embrião; todos os dias determinados para mim foram escritos no teu livro antes de qualquer deles existir. Salmos 139:16).

 

Dessa forma, muitos outros ciclos irão e outros virão, e tal qual as células do seu corpo, a alegria, a paz e o amor se renovarão a cada dia.

 

Osdilson Amorim Oliveira

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Hoje, 30/11, Dia Nacional do Evangélico. Mais uma data para se lembrar. Comemorar o que?

Talvez você não saiba, mas hoje é o Dia Nacional do Evangélico. Pode confirmar lendo logo abaixo a lei. Sim, tem força de lei!

Gostaria de escrever muita coisa a respeito, mas não é possível, pela falta de tempo. Mas não posso me furtar de dizer que historicamente, sempre que a igreja foi institucionalizada, foi reconhecida, tornou-se oficial, ela partiu para extremos (isso desde Constantino, em 330dC - leia a respeito clicando aqui) que se Cristo aqui estivesse fisicamente, teria expulso a todos na base do chicote, como fez na sinagoga. O Cristo não fez sua igreja para ser conivente, parceira e paralela ao mundo, mas para ser do contra, para ir em direção oposta.

Hoje vemos, na substância dessa lei, talvez o resultado de tanta proximidade. Proximidade que se permeia na mídia, nos cultos, em tantas outras atividades que assusta. Muitos dizem que isso é bom. Talvez, tenho minhas dúvidas. Principalmente porque procuro imaginar o que o Senhor Jesus Ressurreto pensa a respeito.

Leia o mandamento legal, e pense a respeito:


Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 12.328, DE 15 DE SETEMBRO DE 2010.

 

Institui o Dia Nacional do Evangélico a ser comemorado no dia 30 de novembro de cada ano.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: 

          Art. 1o  Fica instituído o Dia Nacional do Evangélico, a ser comemorado no dia 30 de novembro de cada ano. 

          Art. 2o  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 

Brasília,  15  de setembro de 2010; 189o da Independência e 122o da República. 

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
João Luiz Silva Ferreira

Este texto não substitui o publicado no DOU de 16.9.2010

Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12328.htm

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

[FRUTO DO ESPÍRITO - AMOR] - Demonstrando o amor de Deus na prática e livrando ao menos nossos queridos do inferno

Falando sobre a virtude do Espírito Santo, chamada amor, não o eros, ou fileo, mas o caritas, entendemos que o verdadeiro amor de Deus implantado em nós pelo seu Espírito Santo, um dos "bagos da jaca", deve impregnar o mundo inteiro com o perfume de Cristo. Aliás, a figura da jaca é interessante na medida em que, uma vez aberta, a fruta madura anuncia pelo seu cheiro sua presença.

Isso me leva a pensar no cheiro do amor, me liga que Deus é amor e imputa esse amor em mim, na medida em que sou lavado e remido pelo sangue de Cristo na cruz, a quem inequívocamente eu entreguei minha vida, e que se tornou meu advogado junto ao pai. Não que de repente me tornei justo, mas fui declarado justo, justificado.

Mas, e os outros? Os parentes, os amigos, o colega de sala, a pessoa que está me olhando nesse momento no órgão público onde estou com o computador no colo e digitando esse e-mail... Será que essas pessoas também estão incluídas nesse amor divino?

Hoje frisamos muito que Deus é amor, e isso é a mais pura verdade. Mas talvez para não ferir suscetibilidades, esquecemos de frisar que Deus também se ira, IRA de verdade! Não é truque de retórica. É verdade! Sim, DEUS TEM ÓDIO!!! Não se assuste irmão, eu e você já estamos livres disso! Mas é pra se assustar mesmo, caso você tem algum parente, amigo, conhecido, etc. (e quem não tem), que ainda não está salvo. Que ainda não provou do Amor de Deus. Talvez precisamos frisar mais em nosso meio a cruz, o sangue, a restituição, o fato de Deus só perdoar o pecado através do sangue; enfim precisamos falar da ira de Deus, de sua pureza, e também de sua onipotência. Precisamos tirar o sentimentalismo quando falarmos de Deus, pois o sentimentalismo nos torna complacentes com o pecado, condescendentes com as soluções humanas.

Eu tenho há muito tempo um texto guardado, um texto de um sermão muito forte, que hoje reli, repensei, refleti. E toda vez que o leio, mesmo tendo absoluta certeza de minha salvação, me causa uma forte emoção, em outras palavras, mesmo sendo salvo, me assusta! E contra talvez alguns que possam pensar equivocadamente que eu queira assustar alguém, e não é esse o meu objetivo, resolvi repassá-lo, e pedir que você o leia calmamente, embora eu duvide que consiga fazê-lo com calma!

Depois da leitura, talvez fique mais fácil deixar que o genuíno fruto do Espírito Santo, o Amor de Deus flua de você como um rio, tal qual descrito no Salmo 1. E assim quem sabe, você não se sentirá culpado e não se assustará tanto quando ler o texto abaixo de novo e lembrar de seus queridos que não têm Cristo. Aliás, não é preciso que sejam queridos: eu sinceramente não desejo o que está escrito abaixo nem para um inimigo, se o tivesse!

O texto se chama: Pecadores nas mãos de um Deus irado.


Esclarecimento:

Pecadores nas Mãos de um Deus Irado foi um sermão pregado por Jonathan Edwards em 8 de julho de 1741, em Enfield, Connecticut.

O sermão foi baseado em Deuteronômio 32:35, '...a seu tempo quando resvalar o seu pé' e proclamava a ira de Deus contra o pecado e uma petição aos ouvintes para viver uma vida santa.

Edwards não era bom orador, mas, enquanto ele pregava, houve pessoas que choravam e clamavam por arrependimento, enquanto que outros se agarravam às colunas da igreja, como se estivessem se sentindo sendo engolidas pelo inferno. Ele teve que esperar as pessoas se acalmarem para terminar o sermão. Após o sermão, Edwards fez um apelo à unidade cristã e também contribui para O Grande Despertamento. Na opinião de Wesley L. Duewel, este sermão contribuiu para a continuação do avivamento.

 

 

Pr. Jonathan Edwards

Tradução: Walter Andrade Campelo

 

"Minha é a vingança e a recompensa, ao tempo que resvalar o seu pé; porque o dia da sua ruína está próximo, e as coisas que lhes hão de suceder, se apressam a chegar." (Deuteronômio 32:35 ACF1)

 

Neste verso está indicada a vingança de Deus sobre os pecaminosos e descrentes israelitas, que eram o povo visível de Deus, e que viviam sob os meios de graça; mas que, não obstante todas as maravilhas das obras de Deus para com eles, permaneciam (como está no verso 28) faltos de conselho, não havendo neles entendimento. Debaixo de todos os cultivos do céu, eles produziam fruto amargo e venenoso; como está nos dois versos próximos que precedem o texto. - A expressão que escolhi como meu texto, ao tempo que resvalar o seu pé, parece encerrar os seguintes fatos, relativos à punição e destruição a que estes israelitas pecadores estavam sujeitos:

 

    Que estavam sempre expostos à destruição; como alguém que se levanta e anda por lugares escorregadios está sempre exposto à queda. Isto está implícito na forma de destruição que vinha sobre eles, sendo representada por seus pés escorregando (resvalando). O mesmo está expresso no Salmo 73:18 "Certamente tu os puseste em lugares escorregadios; tu os lanças em destruição."

    Isto implica, que eles sempre estiveram expostos a uma repentina e inesperada destruição. Como aquele que anda por locais escorregadios está a cada instante sujeito à queda; ele não pode prever o momento em que estará de pé ou o próximo em que cairá; e quando cai, cai subitamente, sem aviso. Isto também está expresso no Salmo 73:18-19 "Certamente tu os puseste em lugares escorregadios; tu os lanças em destruição. Como caem na desolação, quase num momento! Ficam totalmente consumidos de terrores."

    Outra implicação é, que eles estavam sujeitos a cair por si mesmos, sem serem derrubados pela mão de outro; como aquele que se levanta e anda por um terreno escorregadio não precisa de nada além de seu próprio peso para derrubá-lo.

    Que a razão porque eles não haviam ainda caído, e não caíram naquele instante, é apenas que o tempo definido por Deus não havia chegado. Por isto está dito que ao tempo, ou quando o tempo determinado chegar, seus pés irão resvalar (escorregar). Então será permitido que caiam, como estão propensos por seu próprio peso. Deus não irá mais segurá-los nestes lugares escorregadios, mas irá deixá-los cair; e então neste exato instante, cairão em destruição; como aquele que se põe em pé em uma rampa escorregadia e inclinada, à beira de um penhasco, não pode permanecer em pé por si só; quando é solto imediatamente cai e está perdido.

 

O exame das palavras nas quais eu irei agora insistir é este: - "Não há nada que mantenha pecadores, em momento algum, fora do inferno, a não ser a mera graça de Deus". - Por mera graça de Deus, quero dizer sua soberana graça, sua vontade arbitrária, não se prendendo a qualquer obrigação, não impedida por nenhuma forma de dificuldade, coisa alguma mais que a possibilidade da vontade de Deus tida em seu menor grau, ou em qualquer outra consideração, qualquer que seja, nenhuma outra mão há a preservar os pecadores em momento algum. - A verdade deste exame pode aparecer através das seguintes considerações:

 

    Não há nenhuma falta de poder em Deus para lançar pecadores ao inferno a qualquer instante. As mãos dos homens não têm forças quando Deus se levanta. O mais forte não Lhe pode resistir, nem pode escapar de suas mãos. - Ele não somente é capaz de lançar pecadores ao inferno, mas pode fazê-lo muito facilmente. Algumas vezes um príncipe terreno encontra grande dificuldade para subjugar um rebelde que tenha encontrado meios de se fortificar, e que tenha se feito forte pelo número de seus seguidores. Mas, não é assim com Deus. Não há fortaleza que sirva de defesa contra o poder de Deus. E ainda que mãos se unam a outras mãos, e vastas multidões de inimigos de Deus se combinem e se associem, eles serão facilmente feitos em pedaços. Eles são como um grande monte de finas moinhas diante de um tufão; ou grandes quantidades de restolho seco diante de chamas devoradoras. Nós achamos fácil pisar e esmagar um verme que vejamos a se arrastar pelo chão; assim também nos é fácil cortar ou queimar uma fina linha na qual alguma coisa esteja pendurada: pois é fácil assim para Deus, quando deseja, lançar seus inimigos até ao inferno. O que nós somos, para que pensemos em nos colocar contra Ele, por cuja repreensão a terra treme, e diante de quem as rochas são esmagadas?

    Eles merecem ser lançados ao inferno; tanto que a divina justiça nunca se interpõe no caminho, ela não faz nenhuma objeção quanto a Deus usar seu poder no momento de destruí-los. De fato, ao contrário, a justiça clama por uma infinita punição de seus pecados. A justiça divina diz daqueles que geram tais uvas de Sodoma: "Corta o; por que ocupa ainda a terra inutilmente?" Lucas 13.7. A espada da divina justiça está neste momento brandindo sobre suas cabeças, e não há nada além da mão da soberana misericórdia, e da mera vontade de Deus, detendo-a.

    Eles já estão sob uma sentença de condenação ao inferno. Eles não somente merecem, justamente, serem lançados lá, mas a sentença da lei de Deus, que é a eterna e imutável regra de justiça que Deus fixou entre Ele e a humanidade, foi contra eles, e permanece contra eles, tanto que já estão suspensos sobre o inferno. João 3:18 "Quem não crê já está condenado". Assim é que cada homem não convertido pertence ao inferno; que é seu lugar; de lá ele é. João 8:23 "Vós sois de baixo." E para lá estar, é levado; é o lugar onde a justiça, e a palavra de Deus, e a sentença da sua imutável lei serão aplicadas sobre este homem.

    Eles são agora objeto daquela mesma ira e vingança de Deus, que é expressa pelos tormentos do inferno. E a razão pela qual não vão ao inferno neste mesmo instante, não é porque Deus, em poder de quem estão, não esteja neste momento grandemente irado com eles, da mesma forma como está com as muitas miseráveis criaturas que estão agora em tormentos no inferno, as quais lá sentem e suportam a fúria de sua ira. Na verdade, Deus está irado em um grau muito maior com um grande número dos que estão agora na terra; sim, e sem dúvida, com muitos que estão agora nesta congregação (os quais, é possível, estejam bem à vontade), do que está com muitos daqueles que estão agora nas chamas do inferno.

    Tanto que não é porque Deus esteja desatento às suas maldades, e não se ressinta delas, que Ele não deixa sua mão baixar e cortá-los fora. Deus não é de forma alguma como eles próprios, apesar deles O imaginarem como sendo. A Ira de Deus queima contra eles, sua condenação não descansa, o abismo está preparado, o fogo está pronto, a fornalha já está quente, pronta para recebê-los; as chamas estão neste momento intensas e ardentes. A resplandecente espada está afiada, e levantada sobre eles, e o abismo tem aberto sua boca abaixo deles.

    O diabo permanece pronto a cair sobre eles, e apanhá-los como seus próprios, no momento em que Deus o permitir. Eles lhe pertencem; ele tem suas almas em possessão, e sob seu domínio. As Escrituras os representam como suas posses, Lucas 11:21. Os demônios os assistem; estão sempre com eles à sua mão direita; os demônios permanecem aguardando por eles, como vorazes leões famintos que vêem sua presa, e esperam conseguí-la, mas que por enquanto são mantidos afastados. Se Deus retirasse sua mão, pela qual os demônios estão sendo contidos, eles iriam imediatamente voar sobre suas pobres almas. A antiga serpente está escancarada para eles; o inferno abre sua enorme boca para recebê-los; e se Deus assim o permitisse, seriam rapidamente engolidos e estariam perdidos.

    Há nas almas dos pecadores princípios diabólicos reinando, os quais num instante queimariam e arderiam no fogo do inferno, não fosse pela restrição de Deus. Existe guardada na própria natureza do homem carnal, uma fundação para os tormentos do inferno. Existem neles princípios corrompidos, em reinante poder, e em plena possessão deles, que são as sementes do fogo do inferno. Estes princípios estão ativos e são poderosos, e extremamente violentos em sua natureza, e se não fosse pela restringente mão de Deus sobre eles, rapidamente eles se romperiam e se incendiariam, da mesma forma que estas mesmas corrupções, que o mesmo inimigo cria nos corações das almas em danação no inferno, e produziriam os mesmos tormentos que nelas produzem. As almas dos pecadores são comparadas pelas Escrituras a um mar bravo, Isaias 57:20. No momento, Deus restringe sua maldade através de seu imenso poder, como Ele faz com as furiosas ondas do mar turbulento, dizendo: "Até aqui virás, e não mais adiante"2, mas se Deus retirasse este poder restringente, ele levaria rapidamente todos consigo. O pecado é a ruína e a miséria da alma; é destrutivo em sua natureza; e se Deus o deixasse sem sua restrição, nada mais seria necessário para tornar a alma completamente miserável. A corrupção do coração do homem é sem moderação e não tem limites em sua fúria, e enquanto o pecador aqui viver, é como fogo contido pela restrição de Deus; levando-se em conta que se for deixado solto incendiará o curso da natureza e o coração será então uma fossa de pecado, assim se o pecado não fosse restringido, imediatamente transformaria a alma em um forno ardente, ou em uma fornalha de fogo e enxofre.

    Não há segurança para pecadores em momento algum, ainda que não existam meios visíveis de morte à mão. Não há segurança para um homem natural, ainda que agora esteja com saúde, e que não veja de que forma possa já agora sair do mundo por causa de algum acidente, e que não haja qualquer perigo visível em nenhum aspecto de suas condições de vida. A contínua e variada experiência do mundo em todos os tempos, mostra que isto não é evidência de que um homem não esteja à beira da eternidade, ou de que o próximo passo não ocorra em outro mundo. O invisível, os imprevisíveis caminhos e meios pelos quais as pessoas vão subitamente para fora deste mundo são inumeráveis e inimagináveis. Homens inconversos andam sobre o abismo do inferno em uma cobertura podre, e há inúmeros lugares nesta cobertura tão fracos que não suportarão seu peso, e estes lugares não são visíveis. As flechas da morte voam invisíveis mesmo ao meio-dia; a vista mais aguçada não as pode discernir. Deus tem muitos e insondáveis meios de levar pecadores para fora deste mundo e enviá-los ao inferno, e não há nada que mostre isto, de modo que Deus não tem necessidade de ficar à busca de um milagre, ou de alterar o curso normal de sua providência, para destruir qualquer pecador, em um momento qualquer. Todos os meios que existem para que pecadores saiam deste mundo estão nas mãos de Deus, e estão tão universal e absolutamente sujeitos ao seu poder e determinação, que não depende de nada além da mais simples vontade de Deus, para que os pecadores sigam em um instante qualquer para o inferno, mesmo que estes meios jamais tenham sido utilizados, ou que não sejam concernentes ao caso.

    A prudência e o cuidado dos homens naturais em preservar suas próprias vidas, ou o cuidado de outros em preservá-las, não lhes dá segurança em tempo algum. Disto, a divina providência e a experiência universal dão também testemunho. Há esta clara evidência de que a sabedoria própria dos homens não lhes é segurança contra a morte; porque se fosse de outra forma nós veríamos alguma diferença entre os homens sábios e políticos do mundo, e os outros, com relação à sua sujeição a uma morte prematura e inesperada: mas como é isto de fato? Eclesiastes 2:16 "E como morre o sábio, assim morre o tolo!"

    Todos os esforços e a sagacidade dos pecadores, as quais usam para tentar escapar do inferno, enquanto continuam a rejeitar a Cristo, e portanto, permanecendo pecadores, não lhes garantem contra o inferno em nenhum momento. Praticamente qualquer homem natural que ouve sobre o inferno, ilude a si mesmo de que irá escapar dele; ele depende de si mesmo para sua própria segurança, e se ilude sobre o que já fez, sobre o que tem feito, ou sobre o que pretende fazer. Cada um projeta maneiras em sua própria mente sobre como evitará a danação, e se ilude achando que planejou bem para si mesmo, e que estes esquemas não irão falhar. Eles ouvem, na verdade, que há muito poucos salvos, e que grande parte dos homens que antes morreram foram para o inferno; mas, cada um imagina que projetou maneiras melhores para seu próprio escape do que os outros fizeram. Ele não tem a intenção de ir àquele lugar de tormento; diz a si mesmo, que pretende tomar um cuidado efetivo, e estabelecer fórmulas tais que ele mesmo não venha a falhar.

    Mas, os tolos filhos dos homens miseravelmente se iludem a si mesmos com seus próprios esquemas, e certos de sua própria força e sabedoria, confiam em nada mais do que uma sombra. A maior parte daqueles que antes viveram sob estes mesmos meios de graça, e que agora estão mortos, foram indubitavelmente para o inferno; e isto não ocorreu porque eles não foram tão espertos quanto aqueles que agora estão vivos: não aconteceu porque eles não tenham projetado, para si mesmos, maneiras de escapar tão boas que assegurassem seu próprio escape. Se nós pudéssemos falar com eles, e inquirir deles, um por um, se eles esperavam, quando vivos, quando ouviram sobre o inferno, que em algum momento estariam sujeitos àquela miséria, sem dúvida, iríamos ouvir um por um responder: "Não, eu nunca pretendi vir para cá; eu tinha planejado as coisas de outra forma em minha mente; eu pensei que havia planejado bem para mim; - pensei que meu esquema fosse bom. Eu pretendi tomar cuidados efetivos, mas ela veio sobre mim inesperadamente; eu não a procurei naquele instante, ou daquela forma; ela veio como um ladrão: - A morte levou a melhor sobre mim. A Ira de Deus foi rápida demais para mim. Oh, minha amaldiçoada insensatez! Eu estava me iludindo e me agradando com sonhos vãos do que faria na vida futura, ao tempo em que dizia: Paz e segurança, então me sobreveio repentina destruição."

    Deus não se tem colocado sob nenhuma obrigação, por qualquer promessa, a manter homens naturais fora do inferno em momento algum. Deus certamente não fez promessas seja de vida eterna, ou de qualquer livramento ou preservação da morte eterna, além das que estão contidas na aliança da graça, as promessas que são dadas em Cristo, no qual todas as promessas estão, de fato e amém. Mas, certamente não têm interesse nas promessas da aliança da graça aqueles que não são filhos da graça, aqueles que não crêem em quaisquer de suas promessas, e não têm interesse no Mediador da aliança.

 

Assim é que, com relação a tudo o que alguns têm imaginado e aspirado sobre promessas feitas às buscas e batidas honestas de homens naturais, é evidente e manifesto, que a despeito dos esforços que um homem natural tome em religião, a despeito das orações que faça, até o momento em que venha a crer em Cristo, Deus não está de forma alguma obrigado de protegê-lo um momento sequer da destruição eterna.

 

Assim é que, desta forma estão os homens naturais seguros pela mão de Deus, sobre o abismo do inferno; eles merecem o abismo de fogo, e já estão sentenciados a ele; e Deus está sendo terrivelmente provocado; sua ira é tão grande contra eles quanto para com aqueles que estão agora sofrendo as execuções da ferocidade de sua ira no inferno, e eles não tem feito nada para abrandar ou abater esta ira, nem está Deus ao menos preso por qualquer promessa a mantê-los um instante que seja; o diabo os está esperando, o inferno está escancarado para eles, as chamas juntam-se e flamejam por eles, e irão alegremente envolvê-los, e engoli-los; o fogo contido em seus próprios corações está se debatendo para sair. E eles não têm qualquer interesse em um Mediador, não há meios através dos quais alcancem o que lhes pode ser de segurança. Resumindo, eles não têm refúgio, nada que os mantenha, tudo o que os preserva em cada momento é a mera vontade arbitrária e a não pactuada, não obrigada, clemência de um Deus enfurecido.

 

Aplicação

O uso para este terrível tema pode ser o de despertar as pessoas não convertidas nesta congregação. Isto que vocês ouviram é o caso de cada um de vocês que não estão em Cristo. - Aquele mundo de miséria, aquele lago de enxofre incandescente, está largamente estendido abaixo de vocês. Há o horrendo abismo de chamas ardentes da Ira de Deus; há a enorme boca do inferno escancaradamente aberta; e você não tem nada para se manter acima deles, nem nada que para se segurar, não há nada entre você e o inferno além de ar; é somente o poder e a mera vontade de Deus que te mantém acima.

 

Você provavelmente não tem ciência disto; você se percebe sendo mantido fora do inferno, mas não vê a mão de Deus nisto; e busca outras coisas, como o bom estado de sua constituição corporal, você tem cuidado de sua própria vida, e dos meios que você usa para sua própria preservação. Mas, na verdade, estas coisas não são nada, se Deus retirar sua mão, elas não servirão para evitar a sua queda, mais do que o ar rarefeito irá segurar uma pessoa que esteja nele suspensa.

 

A sua fraqueza faz como se você fosse pesado como chumbo, e dirigindo-se abaixo com grande peso e pressão em direção ao inferno; e se Deus permitir que vá, você imediatamente afundará e prontamente descerá e mergulhará no abismo sem fim, e sua saudável constituição, e seu cuidado próprio e prudência, e melhor habilidade, e toda sua justiça, não terão mais influência para sustentá-lo e mantê-lo fora do inferno, do que a teia de uma aranha tem para parar uma rocha que cai. Se não fosse pela vontade soberana de Deus, a terra não te manteria um momento; porque você é um peso para ela, a criação geme por sua causa; a criação está sujeita ao laço da sua corrupção, mas não de bom grado; o sol não brilha de boa vontade sobre você para lhe dar luz para servir ao pecado e a Satanás; a terra não produz de bom grado sua produção para satisfazer suas luxúrias; nem é a boa vontade um palco para sua maldade atuar; o ar não serve de bom grado para você respirar e manter a chama da vida em seus órgãos vitais, enquanto você passa a vida a serviço dos inimigos de Deus. As criações de Deus são boas, e foram feitas para que com elas os homens servissem a Deus, e não são subservientes de boa vontade a nenhum outro propósito, e gemem quando são maltratadas em propósitos tão diretamente contrários à sua natureza e finalidade. E o mundo iria lhe vomitar, se não fosse a pela soberana mão daquele que o sujeitou em esperança. As nuvens negras da Ira de Deus estão agora pairando diretamente sobre suas cabeças, cheias de horrenda tempestade, e inchadas com trovões, e se não fosse pela restringente mão de Deus, elas iriam imediatamente romper-se sobre você. A vontade soberana de Deus, por enquanto, segura seu vento tempestuoso; caso contrário ele viria com fúria, e sua destruição seria como a de um furacão e você seria como a fina moinha trilhada no chão.

 

A Ira de Deus é como grandes águas que por enquanto estão represadas; ela cresce mais e mais, sobe mais e mais alto, até que uma passagem é dada; e quanto mais a corrente é interrompida, mais rápido e poderoso é o seu curso, quando por fim é liberada. É verdade, que o julgamento de suas más obras não foi executado até agora; os dilúvios da vingança de Deus têm sido retidos; mas sua culpa neste meio tempo está constantemente aumentando, e você está a cada dia entesourando mais ira; as águas estão constantemente subindo, e tornando-se mais e mais poderosas, e não há nada além da mera vontade de Deus, que segure as águas, as quais não tem boa vontade de serem paradas, e pressionam duramente para seguir adiante. Se Deus somente retirar sua mão da comporta, ela imediatamente se abrirá, e as ardentes correntes da ferocidade e da ira de Deus, irão ser impelidas à frente com inconcebível fúria, e virá sobre você com poder onipotente; e se sua força fosse dez mil vezes maior do que é, ou ainda, dez mil vezes maior que a força do mais robusto, e vigoroso demônio do inferno, nada seria para lhes resistir ou suportar.

 

O arco da Ira de Deus está esticado, e a flecha está pronta sobre a corda, e a justiça aponta a flecha para seu coração, e estica o arco, e não há nada além da mera vontade de Deus, e de um Deus zangado, sem qualquer promessa ou obrigação que seja, que retenha a flecha por um instante sequer de se embeber em seu sangue. Assim todos vocês que nunca passaram por uma grande mudança de coração, pelo grandioso poder do Espírito de Deus sobre suas almas; todos vocês que não nasceram de novo, e foram feitos novas criaturas, e ressuscitaram da morte em pecados, para um estado de novo, mas, antes estão inteiramente sem experiência de luz e vida, vocês estão nas mãos de um Deus irado. Por mais que vocês possam ter reformado suas vidas em muitas coisas, e possam ter tido sentimentos religiosos, e possam manter uma forma de religião em suas famílias e aposentos, e na casa de Deus, isto não é nada, mas é Sua simples vontade que impede que vocês sejam neste instante engolidos em eterna destruição. Mesmo que vocês agora possam não estar convencidos da verdade do que estão ouvindo, logo estarão plenamente convencidos disto. Aqueles que se foram estando em circunstâncias semelhantes às suas, viram que assim foi com eles; porque a destruição veio sobre a maioria deles repentinamente; quando não a esperavam, e enquanto estavam dizendo, paz e segurança: agora eles vêem, que aquelas coisas das quais dependiam para paz e segurança, não foram mais que ar rarefeito e sombras vazias.

 

O Deus que te segura acima do abismo do inferno, muito como alguém que segura uma aranha, ou algum inseto repugnante sobre o fogo, tem repulsa de ti, e está sendo terrivelmente provocado: sua ira contra você queima como fogo, ele olha para você merecedor de nada mais, que ser lançado no fogo, Ele tem olhos puros demais para suportar ter você em sua visão; você é dez mil vezes mais abominável aos olhos Dele, que a mais detestável serpente venenosa é aos seus. Você O tem ofendido infinitamente mais que um obstinado rebelde a seu príncipe; e ainda assim é nada além que sua mão o que evita que você a cada momento caia no fogo. E não há outra razão a ser dada, por você não ter ido para o inferno na noite passada; que você tenha sido forçado a acordar novamente neste mundo, depois que você fechou os olhos para dormir. Não há outra razão a ser dada, por você não ter sido lançado no inferno desde a hora em que você se levantou de manhã, além da mão de Deus ter te segurado. Não há outra razão a ser dada para você não ter ido para o inferno, desde que você se sentou aqui na casa de Deus, provocando seus puros olhos com a sua perniciosa e pecaminosa maneira de comparecer ao seu culto solene. Sim, não há nada que seja dado como uma razão para que você não caia neste exato momento no inferno.

 

Ó pecador! Considere o temível perigo em que você se encontra: é uma grande fornalha de ira, um enorme abismo sem fundo, cheio do fogo da ira, sobre o que você está mantido pela mão daquele Deus, cuja ira é provocada e inflamada desta tal forma contra você, como contra tantos dos amaldiçoados no inferno. Você está pendurado por uma fina linha, com as chamas da ira divina rompendo por ela, e prontas a cada instante a chamuscá-la, e queimá-la fazendo-a em pedaços; e você não tem qualquer interesse no Mediador, e em nada em que se segurar para se salvar, nada para afastar as chamas da ira; nada de você mesmo, nada do que você tenha feito, nada do que você possa fazer, para induzir Deus a poupá-lo por um instante a mais. - E considere aqui mais particularmente:

    De quem a ira é: é a ira do Deus infinito. Se ela fosse somente a ira do homem, ainda que fosse do mais poderoso príncipe, ela seria comparativamente muito pequena para ser levada em consideração. A ira dos reis é muito temível, especialmente dos monarcas absolutistas, que têm as possessões e as vidas de seus súditos inteiramente em seu poder, à disposição de suas mera vontade. Provérbios 20:2 "Como o rugido do leão é o terror do rei; o que o provoca à ira peca contra a sua própria alma." O súdito que muito enfurece um arbitrário príncipe, está sujeito a sofrer os mais extremos tormentos que a arte humana é capaz de inventar, ou que o poder humano é capaz de infligir. Mas, os grandes potentados terrenos em suas grandiosas majestades e força, e quando equipados de seus maiores terrores, não são mais que fracos e desprezíveis vermes na areia, em comparação com o grande e Todo-Poderoso Criador e Rei do céu e da terra. É muito pouco o que podem fazer, quando muito enfurecidos, e quando têm mostrado o máximo de sua fúria. Todos os reis da terra, diante de Deus, são como gafanhotos; não são nada, e menos que nada: seu amor e seu ódio são para ser desprezados. A ira do grande Rei dos reis, é muito mais terrível que a deles, do mesmo modo que sua majestade é maior. Lucas 12:4-5 "E digo-vos, amigos meus: Não temais os que matam o corpo e, depois, não têm mais que fazer. Mas eu vos mostrarei a quem deveis temer; temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno; sim, vos digo, a esse temei."

    É à ferocidade de sua ira que você está exposto. Nós freqüentemente lemos sobre a fúria de Deus; como em Isaías 59:18 "Conforme forem as obras deles, assim será a sua retribuição, furor aos seus adversários." Assim também Isaías 66:15 "Porque, eis que o SENHOR virá com fogo; e os seus carros como um torvelinho; para tornar a sua ira em furor, e a sua repreensão em chamas de fogo." E em muitos outros lugares. Assim em Apocalipse 19:15, nós lemos sobre "o lagar do vinho do furor e da ira do Deus Todo-Poderoso." As palavras são extremamente terríveis. Se estivesse somente sendo dito, "a Ira de Deus", as palavras implicariam o que é infinitamente terrível; mas está dito "o furor e a ira do Deus Todo-Poderoso." A fúria de Deus! A ferocidade de Jeová! Oh, quão terrível ela será! Quem pode exprimir ou conceber o que estas expressões carregam em si! Mas, é também "o furor e a ira do Deus Todo-Poderoso." Como tal haverá uma grande manifestação de seu onipotente poder através do qual o furor de sua ira será infligido, desta forma a onipotência será como se estivesse enfurecida, e manifesta, de um modo que os homens não costumam manifestar sua força e o furor de sua ira. Oh! Então, qual não será a conseqüência! O que acontecerá aos pobres vermes que a sofrerão! As mãos de quem poderão ser fortes? E o coração de quem poderá subsistirá? Em que terrível, inexprimível, inconcebível profundidade de miséria será a pobre criatura mergulhada, aqueles que estarão sujeitos a isto!

    Considere isto, você que está aqui presente, e que ainda permanece em um estado de não regeneração: Que Deus executar a ferocidade de sua raiva, implica, que ele infligirá ira sem qualquer piedade. Quando Deus olha para o indescritível extremo de seu caso, Ele vê seu tormento ser tão grandemente desproporcional à sua força, e vê como sua pobre alma está oprimida, e afunda, como se estivesse em uma infinita escuridão; mas, não terá compaixão de você, Ele não irá reprimir as execuções de sua ira, ou mesmo tornará sua mão mais leve; não haverá moderação ou misericórdia, nem reterá Deus de forma alguma seu vento impetuoso; Ele não terá preocupação com seu bem-estar, nem tampouco será cuidadoso de qualquer outro modo a fim de que você não sofra, exceto tão somente que você não sofrerá além do que a estrita justiça requer. Nada será contido, já que é dificílimo para você suportar. Ezequiel 8:18 "Por isso também eu os tratarei com furor; o meu olho não poupará, nem terei piedade; ainda que me gritem aos ouvidos com grande voz, contudo não os ouvirei." Agora Deus está pronto a perdoá-lo; este é um dia de misericórdia, você pode clamar agora com algum alento de obter misericórdia. Mas, uma vez que o dia da misericórdia tenha passado, seu mais lastimoso e doloroso choro e grito será em vão; você estará completamente perdido e posto longe de Deus, assim como qualquer preocupação para com o seu bem-estar. Deus não terá outra forma de tratá-lo, senão em miserável sofrimento, você continuará a existir sem nenhuma outra finalidade; porque você será um vaso de ira cheio de destruição; e não haverá outro uso para este vaso, além de estar cheio de ira. Deus estará tão distante de perdoá-lo quando você clamar por Ele, que está dito que Ele irá somente "rir e zombar", Provérbios 1:25-26 ss.

    Quão terríveis são estas palavras, em Isaías 63:3, as quais são palavras do grande Deus: "e os pisei na minha ira, e os esmaguei no meu furor; e o seu sangue salpicou as minhas vestes, e manchei toda a minha vestidura." Talvez seja impossível conceber palavras que carreguem em si maiores manifestações destas três coisas, quais sejam, o desprezo, e o ódio, e o furor da indignação. Se você clamar ao Senhor que o perdoe, Ele estará tão distante de perdoá-lo em seu caso sombrio, ou de mostrar-lhe ao menos consideração ou favor, que ao invés disto, irá somente esmagá-lo sob o pé. E ainda que Ele saiba que você não pode suportar o peso da onipotência lhe pisando, ainda assim Ele não terá qualquer consideração, mas irá esmagá-lo sob seu pé sem misericórdia. Ele irá espremer o seu sangue, e irá fazê-lo saltar, e salpicará suas vestes, e manchará toda a sua vestidura. Ele irá não somente odiá-lo, mas terá você, no mais profundo desprezo; nenhum outro lugar será cogitado para você estar, a não ser debaixo de seu pé, para ser pisado como a lama das ruas.

    A miséria a que você está exposto é aquela que Deus irá infligir até este fim, uma vez que Ele deve mostrar o que é a ira de Jeová. Deus tem tido isto em seu coração para mostrar aos anjos e aos homens, tanto quão excelente é seu amor, quanto quão terrível é sua ira. Algumas vezes reis terrenos tem uma idéia para mostrar quão terrível é sua ira, através de punições extremas eles executarão aqueles que os provocarem. Nabucodonosor, aquele poderoso e orgulhoso monarca do império Caudeu, estava disposto a mostrar sua ira quando se enfureceu contra Sadraque, Mesaque e Abednego, e desta forma deu ordens para que a queima do fogo da fornalha fosse aquecida sete vezes mais que antes; sem dúvida, ela foi aumentada ao maior grau de violência a que a arte humana poderia aumentá-la. Não obstante, o grande Deus está também desejoso de mostrar sua ira, e de magnificar sua tremenda majestade e grandioso poder em sofrimentos extremos aos seus inimigos. Romanos 9:22 "E que direis se Deus, querendo mostrar a sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para a perdição?" E vendo isto em seu projeto, e o que havia determinado, ainda para mostrar quão terríveis são a irrestrita ira, a fúria e a ferocidade de Jeová, Ele levará isto a cabo. Será algo efetuado e causado que será horrível para quem o testemunhar. Quando o grande e irado Deus se levanta e executa sua terrível vingança sobre o infeliz pecador, e o miserável está verdadeiramente sofrendo o infinito peso e o poder de sua indignação, então Deus irá evocar todo o universo a ver quão tremenda majestade e grandioso poder pode nisto ser visto. Isaías 33:12-14 ss "E os povos serão como as queimas de cal; como espinhos cortados arderão no fogo. Ouvi, vós os que estais longe, o que tenho feito; e vós que estais vizinhos, conhecei o meu poder. Os pecadores de Sião se assombraram, o tremor surpreendeu os hipócritas. Quem dentre nós habitará com o fogo consumidor? Quem dentre nós habitará com as labaredas eternas?"

    Deste modo, estas coisas acontecerão com você que está em um estado de não conversão, se continuar nele; o infinito poder, e a majestade, e o terror do onipotente Deus serão magnificados sobre você, na indescritível força de seus tormentos. Você será atormentado na presença dos santos anjos, e na presença do Cordeiro; e quando você estiver neste estado de sofrimento, os gloriosos habitantes do céu virão adiante e verão o terrível espetáculo, porque poderão ver o que é ira e o furor do Todo-Poderoso; e quando eles tiverem visto, irão se prostrar e adorar aquele grande poder e majestade. Isaías 66:23-24 "E será que desde uma lua nova até à outra, e desde um sábado até ao outro, virá toda a carne a adorar perante mim, diz o SENHOR. E sairão, e verão os cadáveres dos homens que prevaricaram contra mim; porque o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará; e serão um horror a toda a carne."

    É uma ira eterna. Já seria horrível sofrer esta fúria e ira do Deus Todo-Poderoso por um momento, mas, você a sofrerá por toda a eternidade. Não haverá fim para esta extraordinariamente horrível miséria. Quando você olhar para frente, verá um longo futuro, uma continuação sem fim diante de você, que irá engolir seus pensamentos, e assombrar sua alma; e você se desesperará completamente por ter apenas por um momento algum livramento, algum fim, algum alívio, um descanso qualquer. Você terá plena consciência de que irá se desgastar por longos séculos, milhões e milhões de séculos, lutando e combatendo contra esta vingança onipotente e sem misericórdia; e então quando você estiver assim, quando tantos séculos tenham realmente sido gastos por você desta forma, você saberá que tudo isto é somente um ponto comparado com o que ainda falta. Posto que sua punição será na verdade infinita. Oh, quem pode expressar qual é o estado de uma alma em tais circunstâncias! Tudo que nós possivelmente possamos dizer sobre este assunto, daria apenas uma representação muito fraca e débil; ele é inexprimível e inconcebível: Pois "quem conhece o poder da Ira de Deus?"

 

Quão horrível é o estado daqueles que estão diariamente e de hora em hora em risco de sofrer esta grande ira e infinita miséria! E este é o sombrio caso de cada alma nesta congregação que não tenha nascido de novo, mesmo que de outro modo possam ser morais e retos, sóbrios e religiosos. Oh, que você considere isto, seja você jovem ou velho! Há razão para pensar, que há muitos agora nesta congregação ouvindo este discurso, que serão realmente os objetos desta mesma miséria por toda a eternidade. Nós não sabemos quem são, ou em quais assentos estão assentados, ou que pensamentos têm agora. Pode ser que agora estejam despreocupados, e ouçam todas estas coisas sem muita perturbação, e que estejam agora se agradando supondo que não são estas pessoas, e prometendo a si mesmos que irão escapar. Se você soubesse que havia uma pessoa, e apenas uma, em toda a congregação, que estava para ser objeto desta miséria, que coisa terrível seria pensar sobre isto! Se nós soubéssemos quem ela é, que horrível visão seria ver tal pessoa! Como poderia todo o resto da congregação se levantar e lastimosa e amargamente chorar sobre ele! Mas, ai meu Deus! Ao invés de um, quantos provavelmente irão se lembrar deste discurso no inferno? E seria um milagre, se alguns dos que agora estão presentes, não estejam no inferno em pouco tempo, mesmo antes de este ano acabar. E não seria milagre algum se algumas pessoas, das que estão agora sentadas aqui, em alguns dos assentos deste local de reunião, com saúde, quietos e seguros, estejam lá antes de amanhã de manhã. Aqueles de vocês que finalmente continuarem em uma condição natural, que os mantenha fora do inferno por mais um pouco, logo estarão lá! Sua danação não descansa; ela virá rapidamente, e, com toda probabilidade, muito repentinamente sobre muitos de vocês. Vocês têm razão para se admirarem por já não estarem no inferno. Este é sem dúvida o caso de alguns que vocês têm visto e conhecido, que nunca mereceram o inferno mais que vocês, e que antes davam a impressão de que provavelmente estariam agora vivos como vocês. O caso deles está além de qualquer esperança; eles estão clamando em extrema miséria e perfeito desespero; mas, aqui vocês estão na terra dos viventes e na casa de Deus, e têm uma oportunidade de obter salvação. O que não dariam aquelas pobres almas condenadas e sem esperança por um dia de oportunidade como o que vocês estão agora desfrutando!

 

E agora você tem uma extraordinária oportunidade, um dia no qual Cristo abriu largamente a porta da misericórdia, e permanece chamando e clamando com grande voz pelos pobres pecadores; um dia no qual muitos estão reunindo-se a Ele, e apressando-se ao reino de Deus. Muitos estão diariamente vindo do leste, oeste, norte e sul; muitos que estavam até muito recentemente na mesma condição miserável em que você está, e que agora estão em um estado de alegria, com seus corações cheios com amor por aquele que os amou, e os lavou de seus pecados em seu próprio sangue, e jubilosos de esperança pela glória de Deus. Quão terrível é ser deixado para trás em tal dia! Ver tantos outros festejando, enquanto você está definhando e perecendo! Ver tantos jubilosos e cantando pela alegria no coração, enquanto você tem motivos para prantear pela culpa do coração, e urra pela vexação do espírito! Como você pode descansar um momento sequer em tal condição? Não são suas almas tão preciosas quanto as almas das pessoas de Suffield3, onde estão dia a dia se unindo a Cristo?

 

Não há muitos aqui que tenham vivido muito tempo no mundo, e que não tenham até hoje nascido de novo? E portanto, são estrangeiros na comunidade de Israel, e não têm feito nada durante a vida, além de entesourar ira para o dia da ira? Oh, senhores, seu caso, de uma forma especial, é extremamente perigoso. Sua culpa e dureza de coração são enormes. Vocês não vêem quão comumente pessoas da sua idade passam e se vão, na presente notável e maravilhosa dispensação da misericórdia de Deus? Vocês têm necessidade de considerarem a si mesmos, e acordarem inteiramente deste sono. Vocês não podem suportar a fúria e a ira do Deus infinito. - E vocês, homens jovens, e jovens mulheres, irão negligenciar este precioso momento que vocês estão desfrutando agora, quando tantos outros de sua idade estão renunciando às futilidades da mocidade, e se unindo a Cristo? Vocês especialmente têm agora uma extraordinária oportunidade; mas se vocês a negligenciarem, logo acontecerá com vocês como com aquelas pessoas que gastam todos os preciosos dias da juventude em pecado, e estão agora chegando a esta horrível condição em cegueira e dureza. - E vocês, jovenzinhos, que não são convertidos, não sabem que vocês estão indo para o inferno, para suportar a terrível ira daquele Deus, que está agora zangado com vocês cada dia e cada noite? Vocês estarão contentes por serem jovenzinhos do diabo, quando tantos outros jovenzinhos na terra são convertidos, e se tornaram santos e alegres filhos do Rei dos reis?

 

E permita que cada um que ainda está sem Cristo, e pendurado sobre o abismo do inferno, sejam eles homens ou mulheres de avançada idade, ou de meia idade, ou jovens, ou ainda crianças, ouça agora com muita atenção aos altos clamores da palavra e da providência de Deus. Este ano aceitável do Senhor, um dia de tão grandes bênçãos a alguns, será sem dúvida um dia de notável vingança para outros. A dureza do coração dos homens, e suas culpas aumentam a passo largo em um dia como este, se negligenciam suas almas; e nunca houve tão grande perigo para estas pessoas que cedem à dureza do coração e à cegueira da mente. Deus agora parece estar apressadamente recolhendo seus eleitos em todas as partes da terra; e provavelmente a maior parte dos adultos que nunca serão salvos, será agora levada em pouco tempo, e que isto será como foi a grande expansão do Espírito sobre os judeus nos dias dos apóstolos; os eleitos irão obter, e o restante terá os olhos tapados. Se este for o seu caso, você amaldiçoará eternamente este dia, e amaldiçoará o dia em que nasceu, por ver tal período de expansão do Espírito de Deus, e desejaria que houvesse morrido e ido para o inferno antes de ter visto isto. Agora indubitavelmente está o machado, como esteve nos dias de João o Batista, colocado de forma extraordinária nas raízes das árvores, e cada árvore que não produzir bons frutos, poderá ser derrubada e lançada ao fogo.

 

Contudo, permita que cada um que está sem Cristo, acorde agora e afaste-se da ira que virá. A Ira do Deus Todo-Poderoso está, neste momento, sem dúvida pendendo sobre grande parte desta congregação: Permita que cada um se afaste de Sodoma: "Apressem-se e escapem por suas vidas; não olhem para trás; escapem lá para o monte, para que não sejam consumidos."

 

 

1 Todos os textos bíblicos citados neste estudo foram extraídos da tradução de João Ferreira de Almeida - Corrigida e Revisada Fiel ao Texto Original (ACF), editada pela Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil, exceto quando houver sido especificado em contrário.

2 Jó 38:11

3 Uma cidade das redondezas

 

 


quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A manipulação do homem através da linguagem

Srs.:

Há muitas verdades de entremeio ao texto abaixo colocado.  Não podemos nos alhear, em nenhuma hipótese aos acontecimentos em nosso redor, especialmente porque, discretamente instalada no meio deles está a manipulação, que não passa de um manejo orientado a nos considerar como objeto, avlitando nossa condição humana.


 

 

 

A Manipulação do Homem através da Linguagem [1]

 

 

 

 

 

 

 

 

Alfonso López Quintás

 Tradução: Elie Chadarevian

 

 

 

 

     O grande humanista e cientista Albert Eisntein fez esta severa advertência: "A força desencadeada pelo átomo transformou tudo menos nossa forma de pensar. Por isso caminhamos para uma catástrofe sem igual".

 

     Que forma de pensar deveríamos ter mudado para evitar esta hecatombe? Sem dúvida, Einstein se referia ao estilo de pensar objetivista, dominador e possessivo que se esgotou com a primeira guerra mundial e não foi substituído por um modo de pensar, sentir e querer mais adequado à nossa realidade humana. 

 

     Os pensadores mais lúcidos têm insistido desde o entre guerras a mudar o ideal, realizar uma verdadeira metanoia e, mediante uma decidida vontade de servir, superar o afã de poder. Esta mudança foi realizada em círculos restritos, mas não nas pessoas e nos grupos que decidem os rumos da sociedade. Nestes continuou operante um afã descontrolado de domínio, domínio sobre coisas e sobre pessoas.

 

     O domínio e controle sobre os seres pessoais se leva a cabo mediante as técnicas de manipulação. O exercício da manipulação das mentes tem especial gravidade hoje por três razões básicas:

 

     1)   Continua orientando a vida para o velho ideal de domínio, que provocou duas hecatombes mundiais e hoje não consegue preencher nosso espírito pois já não podemos crer nele.

 

     2)   Impede de se dar uma reviravolta para um novo ideal que seja capaz de levar à plenitude de nossa vida.

 

     3)   Incrementa a desordem espiritual de uma sociedade que perdeu o ideal que perseguiu durante séculos e não consegue descobrir um novo que seja mais de acordo com a natureza humana.

 

     Se quisermos colaborar eficazmente a construir uma sociedade melhor, mais solidária e mais justa, devemos identificar os ardis da manipulação e aprender a pensar com todo o rigor. Não é muito difícil. Um pouco de atenção e agudeza crítica nos permitirá desmascarar as prestidigitações de conceitos que se estão cometendo e aprender a fazer justiça à realidade. Esta fidelidade ao real nos proporcionará uma imensa liberdade interior.

 

     Não basta viver num regime democrático para ser livres de verdade. A liberdade deve ser conquistada dia a dia opondo-se àqueles que ardilosamente tentam dominar-nos com os recursos dessa forma de ilusionismo mental que é a manipulação. Esta conquista só é possível se tivermos uma ideia clara a respeito de quatro questões:

 

1º) O que significa manipular?

 

2º) Quem manipula?

 

3º) Para que manipula?

 

4º) Que tática utiliza para este fim?

 

     A análise destes quatro pontos permitir-nos-á discernir se é possível dispor de um antídoto para a manipulação. Estamos a tempo de defender nossa liberdade pessoal e tudo o que ela representa. Façamo-lo decididamente.

 

1. O que significa manipular?

 

     Manipular equivale a manejar. De per si, somente os objetos são suscetíveis de manejo. Posso utilizar uma esferográfica para minhas finalidades, guardá-la, trocá-la, descartá-la. Estou no meu direito, porque se trata de um objeto. Manipular é tratar uma pessoa ou grupo de pessoas como se fossem objetos, a fim de dominá-los facilmente. Essa forma de tratamento significa um rebaixamento, um aviltamento.

 

     Esta redução ilegítima das pessoas a objetos é a meta do sadismo. Ser sádico não significa ser cruel, como geralmente se pensa. Implica em tratar uma pessoa de uma forma que  a rebaixa de condição. Esse rebaixamento pode realizar-se através da crueldade ou através da ternura erótica.

 

     Quando, ainda em tempos recentes, introduzia-se um grupo numeroso de prisioneiros num vagão de trem como se fossem embrulhos, e os faziam viajar durante dias e noites, o que se pretendia não era tanto fazê-los sofrer, mas aviltá-los. Sendo tratados como meros objetos, em condições subumanas, acabavam considerando-se mutuamente seres abjetos e repelentes. Tal consideração os impedia de unirem-se e formar estruturas sólidas que poderiam gerar uma atitude de resistência.

 

     Reduzir uma pessoa à condição de objeto para dominá-la sem restrições é uma prática manipuladora sádica. Já a carícia erótica reduz a pessoa ao corpo, a mero objeto de prazer. É reducionista, e, nessa mesma medida, sádica, ainda que pareça terna. A carícia pode ser de dois tipos: erótica e pessoal. Para compreender o que, a rigor, o erotismo é, recordemos que, segundo a pesquisa ética contemporânea, o amor conjugal apresenta quatro aspectos ou ingredientes:

 

     1) A sexualidade, na medida em que implica atração instintiva pela outra pessoa, de prazer sensorial, de comoção psicológica...;

 

     2) A amizade, forma de unidade estável, afetuosa, compreensiva, colaboradora, que deve ser criada de modo generoso, já que não possuímos instintos que, postos em jogo, deem lugar a uma relação deste gênero;

 

     3) A projeção comunitária do amor. O homem, para viver como pessoa, deve criar vida comunitária. O amor começa sendo dual e privado, mas abriga em si uma força interior que o leva a adquirir uma expansão comunitária. Isto acontece no dia do casamento, quando a comunidade de amigos e - no caso religioso - de fiéis acolhe o amor dos novos esposos;

 

     4) A relevância e fecundidade do amor. O amor conjugal tem um poder singular para incrementar o afeto entre os esposos e dar vida a novos seres. Não há nada maior no universo do que uma vida humana e o amor verdadeiro por outra pessoa. Por isso o amor conjugal tem uma relevância singular, uma plenitude de sentido e um valor impressionantes.

 

     Estes quatro elementos (sexualidade, amizade, projeção comunitária, relevância) não devem estar meramente justapostos, um ao lado do outro. Devem estar estruturados. Uma estrutura é uma constelação de elementos articulados de tal forma que, se um falha, o conjunto desmorona.

 

     Agora podemos compreender de modo preciso o que é o erotismo. Consiste em isolar o primeiro elemento, a sexualidade, para obter uma recompensa passageira, e prescindir dos outros três. Essa separação puramente passional destrói o amor na raiz, privando-o de seu sentido pleno e de sua identidade. Por isso é violento ainda que pareça cordial e terno. Exerço a sexualidade isolada, porque interessa a meus próprios fins, e prescindo da amizade. Na realidade, não amo a outra pessoa; desejo o prazer que me é dado por algumas de suas qualidades. Deixo também de lado a expansão comunitária do amor. Não presto atenção à vida de família que o amor está chamado a promover. Recolho-me à solidão de meus proveitos  imediatos. Por isso reduzo a outra pessoa a mera fonte de satisfações para mim. Essa redução desconsiderada é violenta e sádica. Posso jurar amor eterno, mas serão palavras vãs, pois o que aqui entendo por amor é simplesmente interesse de saciar minha avidez erótica.

 

     É muito conveniente distinguir nitidamente nossos dois planos: o corpóreo e o espiritual, o que é passível de ser manejado e o que requer respeito. Quando uma pessoa acaricia a outra, põe seu corpo em primeiro plano, concede-lhe uma atenção especial. Sempre que umas pessoas se relacionam com outras, seu corpo assume certo papel na medida em que lhes permite falar, ouvir, ver...  Se não se trata de uma comunicação afetiva, o corpo exerce a função de trampolim para passar ao mundo das significações que se querem transmitir. Falamos durante horas sobre uma  coisa e outra, e ao final lembramos perfeitamente o que dissemos, a atitude que tomamos, os fins que perseguimos, mas possivelmente não sabemos de que cor são os olhos do nosso interlocutor. Estivemos juntos, mas não detivemos nossa atenção na vertente corpórea. Não acontece assim nos momentos de trato amoroso. Nestes, o corpo da pessoa amada adquire uma densidade peculiar e prende a atenção daqueles que manifestam seu amor. O amante volta-se de modo intenso para o corpo da amada. Vê-se nele a expressão sensível do ser amado e toma seu gesto de ternura como um ato no qual está incrementando seu amor à pessoa, seu modo de acariciar terá um caráter pessoal. Em tal caso, o corpo acariciado adquire honras de protagonista, mas não exclui a pessoa, antes a torna presente de modo tangível e valioso. A carícia pessoal não se limita ao corpo, se estende à pessoa. Quando duas pessoas se abraçam, seus corpos entrelaçados assumem um papel de destaque, mas não constituem a meta da atenção; são o meio de expressão do afeto mútuo. A pessoa, em tal abraço, não fica relegada a um segundo plano. É, pelo contrário, realçada. Porém, se a atenção se detém no corpo acariciado, simplesmente pela atração sensorial que tal gesto implica, o corpo invade todo o campo da pessoa. Esta é vista como objeto, realidade de que se pode dispor, manejar, possuir, desfrutar... Ora, um objeto não pode ser amado, mas somente apetecido. Daí o caráter triste da expressão "mulher-objeto" aplicada a certas figuras femininas exibidas como objeto de contemplação em alguns espetáculos ou tomadas como objeto de posse no dia-a-dia.

 

     O amor erótico dos sedutores do tipo Dom Juan é possessivo, e na mesma medida une-se ao engodo e à violência. Dom Juan, o "Burlador de Sevilha" - segundo a perspicaz formulação de Tirso de Molina -, se comprazia em burlar as vítimas de seus enganos e resolver as situações comprometedoras com o manejo eficaz da espada. Esta violência inata, muitas vezes encoberta, do amor erótico explica como se pode passar sem solução de continuidade de situações de máxima "ternura" aparente a outras de extrema violência. Na realidade, aí não há ternura, mas sim redução de uma pessoa a objeto. A violência de tal redução não fica menor ao afirmar que se trata de um objeto adorável, fascinante. Estes adjetivos não retiram do substantivo "objeto" o que ele tem de injusto, de não ajustado à realidade. Rebaixar uma pessoa do nível que lhe corresponde é uma forma de manipulação agressiva que gera os diferentes modos de violência que a sociedade atual registra. A principal tarefa dos manipuladores consiste em ocultar a violência sob o véu sedutor do fomento das liberdades.

 

     Na origem da cultura ocidental, Platão entendeu por "eros" a força misteriosa que eleva o homem a regiões cada vez mais altas de beleza, bondade e perfeição. Atualmente, se entende por "erotismo" o manejo desenfreado das forças sexuais, sem outro critério e norma que o da própria satisfação imediata. Obviamente, este encerramento no plano do proveito  imediato indica uma regressão cultural.

 

2. Quem manipula?

 

     Manipula aquele que quer vencer-nos sem convencer-nos, seduzir-nos para que aceitemos o que nos oferece sem dar-nos razões. O manipulador não fala à nossa inteligência, não respeita nossa liberdade; atua astutamente sobre nossos centros de decisão a fim de arrastar-nos a tomar as decisões que favorecem seus propósitos.

 

     Em um comercial de televisão apresentou-se um carro luxuoso. Em seguida, no lado oposto da tela, apareceu a figura de uma belíssima jovem. Não disse uma só palavra, não fez o menor gesto; simplesmente mostrou sua encantadora imagem. Imediatamente o carro começou a andar por paisagens exóticas, e uma voz nos sussurrou amavelmente ao ouvido: "Deixe rolar  todo tipo de sensações!". Nesse anúncio não se dá razão alguma para se escolher esse carro em vez de outro. Sua imagem articula-se com realidades atrativas para milhões de pessoas e envolve todas no halo de uma frase impregnada de aderências sentimentais. Desse modo, o carro fica aureolado de prestígio. Quando você for à concessionária, você se sentirá inclinado a escolher este carro. E o carro você leva, mas não a mulher. Na verdade, ninguém tinha prometido que, se você comprasse o carro, teria a possibilidade de acesso à mulher, o que teria sido um modo de dirigir-se à sua inteligência. Limitaram-se a influir sobre sua vontade de forma tortuosa, astuta. Não lhe enganaram; lhe manipularam, que é uma forma sutil de engano. Estimularam teu apetite com sensações gratificantes a fim de orientar tua vontade para a compra deste produto, não para satisfazer ou ajudar a desenvolver tua personalidade. Você foi  reduzido a mero cliente. Essa forma de reducionismo é a quintessência da manipulação.

 

     Este tipo de manipulação comercial costuma acompanhar outra muito mais perigosa ainda: a manipulação ideológica, que impõe ideias e atitudes de forma oculta, graças à força de arrasto de certos recursos estratégicos. Assim, a propaganda comercial difunde, muitas vezes, a atitude consumista e a faz valer sob o pretexto de que o uso de tais e quais artefatos é sinal de alta posição social e de progresso. Um anúncio de um carro luxuoso dizia: "O carro dos vencedores. Você que é um vencedor deve usar este carro, que vence na estrada. Carro tal: o vitorioso!"

 

     Quando se quer impor atitudes e ideias referentes a questões básicas da existência - a política, a economia, a ética, a religião...-, a manipulação ideológica torna-se extremamente perigosa. Atualmente, muitas vezes se entende por "ideologia" um sistema de ideias esclerosadas, rígido, que não suscita adesões por carecer de vigência e, portanto, de força persuasiva. Se um grupo social assume radicalmente este sistema como programa de ação e quer impô-lo, só dispõe de dois recursos:

 

 

1.    A violência, que se encaminha para a tirania;

 

2.  A astúcia e recorre à manipulação.

 

     As formas de manipulação praticadas por razões "ideológicas" costumam mostrar um notável refinamento, já que são programadas por profissionais de estratégia [2] .

 

3. Para que se manipula?

 

     A manipulação corresponde, em geral, à vontade de dominar pessoas e grupos em algum aspecto da vida e dirigir sua conduta. A manipulação comercial quer converter-nos em clientes, com o simples objetivo de que adquiramos um determinado produto, compremos entradas para certos espetáculos, nos associemos ao clube tal...  O manipulador ideólogo pretende modelar o espírito de pessoas e povos a fim de adquirir domínio sobre eles de forma rápida, contundente, massiva e fácil. Como é possível dominar um povo desta forma? Reduzindo-o de comunidade a massa.

 

     As pessoas, quando têm ideias valiosas, convicções éticas sólidas, vontade de desenvolver todas as possibilidades de seu ser, tendem a unir-se solidariamente e estruturar-se em comunidades. Devido à sua coesão interna, uma estrutura comunitária torna-se inexpugnável. Pode ser destruída de fora com meios violentos, mas não dominada interiormente por meio de assédio espiritual. Se as pessoas que integram uma comunidade perdem a capacidade criadora e não se unem entre si com vínculos firmes e fecundos, deixam de integrar-se numa autêntica comunidade; dão lugar a um punhado amorfo de meros indivíduos: uma massa. O conceito de massa é qualitativo, não quantitativo. Um milhão de pessoas que se manifestam numa praça com um sentido bem definido e ponderado não constituem uma massa, mas sim uma comunidade, um povo. Duas pessoas, um homem e uma mulher, que compartilham a vida numa casa mas não se encontram devidamente unidas formam uma massa. A massa se compõe de seres que agem entre si como se fossem objetos, através de justaposição e choque. A comunidade é formada por pessoas que unem seus âmbitos de vida para dar lugar a novos âmbitos e enriquecer-se mutuamente.

 

     Ao carecer de coesão interna, a massa é facilmente dominável e manipulável pelos sequiosos do poder. Isso explica que a primeira preocupação de todo tirano - tanto nas ditaduras como nas democracias, já que em ambos os sistemas políticos existem pessoas desejosas de vencer sem necessidade de convencer - seja a de privar as pessoas, na maior medida possível, da capacidade criadora. Tal despojamento se leva a cabo mediante as táticas de persuasão dolosa que a manipulação mobiliza.

 

4. Como se manipula?

 

     Numa democracia as coisas não são fáceis para o tirano. Ele quer dominar o povo, e deve fazê-lo de forma dolosa para que o povo não perceba, pois, numa democracia, o que os governantes prometem é, antes de tudo, liberdade. Nas ditaduras se promete eficácia à custa das liberdades. Nas democracias se prometem níveis nunca alcançados de liberdade ainda que à custa da eficácia. Que meios um tirano tem à sua disposição para submeter o povo enquanto o convence de que é mais livre do que nunca?

 

     Esse meio é a linguagem. A linguagem é o maior dom que o homem possui, mas também, o mais arriscado. É ambivalente: a linguagem pode ser terna ou cruel, amável ou displicente, difusora da verdade ou propagadora da mentira. A linguagem oferece possibilidades para, em comum, descobrir a verdade, e proporciona recursos para tergiversar as coisas e semear a confusão. Basta conhecer tais recursos e manejá-los habilmente, e uma pessoa pouco preparada mas astuta pode dominar facilmente as pessoas e povos inteiros se estes não estiverem de sobreaviso. Para compreender o poder sedutor da linguagem manipuladora, devemos estudar quatro pontos: os termos, o esquemas, as propostas e os procedimentos.

 

A)  Os termos

 

     A linguagem cria palavras, e em cada época da história algumas delas adquirem um prestígio especial de forma que ninguém ousa questioná-la. São palavras "talismã" que parecem condensar em si tudo que há de excelente na vida humana.

 

     A palavra talismã de nossa época é liberdade. Uma palavra talismã tem o poder de prestigiar as palavras que dela se aproximam e desprestigiar as que se opõem ou parecem opor-se a ela. Hoje aceita-se como óbvio - o manipulador nunca demonstra nada, assume como evidente o que lhe convém - que a censura - todo tipo de censura - sempre se opõe à liberdade. Consequentemente, a palavra censura está atualmente desprestigiada. Já as palavras independência, autonomia, democracia, cogestão estão unidas com a palavra liberdade e convertem-se, por isso, numa espécie de termos talismã por aderência.

 

     O manipulador dos termos talismã, sabe que, ao introduzi-los num discurso, o povo fica intimidado, não exerce seu poder crítico, aceita ingenuamente o que lhe é proposto. Quando, em certo país europeu, realizou-se uma campanha a favor da introdução da lei do aborto, o ministro responsável de tal lei tentou justificar-se com o seguinte raciocínio: "A mulher tem um corpo e é necessário dar à mulher liberdade para dispor desse corpo e de tudo que nele acontece". A afirmação de que "a mulher tem um corpo" é desmontada pela melhor filosofia desde há quase um século. Nem a mulher nem o homem temos corpo; somos corpóreos. Há um abismo enorme entre estas duas expressões. O verbo ter é adequado quando se refere a realidades possuíveis ou seja: objetos. Mas o corpo humano, o da mulher e o do homem, não é algo possuível, algo do qual possamos dispor, é uma vertente de nosso ser pessoal, como o é o espírito. Estendo a mão para cumprimentar e você sente a vibração do meu afeto pessoal. É toda minha pessoa que sai ao seu encontro. O fato de que meu ser pessoal inteiro vibre na palma de minha mão põe em evidência que o corpo não é um objeto. Não há objeto, por excelente que seja, que tenha esse poder. O ministro intuiu sem dúvida que a frase "a mulher tem um corpo" é muito frágil, não se sustenta no estado atual da pesquisa filosófica e, para dar força a seu argumento, introduziu imediatamente o termo talismã liberdade: "A mulher tem um corpo e é necessário dar à mulher liberdade para dispor desse corpo...". Ele sabia que, com a mera utilização desse termo supervalorizado no momento atual, milhões de pessoas iam encolher-se timidamente: "É melhor não contestar essa sentença porque o que está em jogo é a liberdade e serei tachado de antidemocrata, de fascista, de radical". E assim efetivamente aconteceu.

 

     Se queremos ser interiormente livres de verdade, devemos perder o medo da linguagem do manipulador e matizar o sentido das palavras. O ministro não indicou a que tipo de liberdade se referia, porque o primeiro mandamento do demagogo é não matizar a linguagem. De fato, ele aludia à liberdade, à "liberdade de manobra", à liberdade - neste caso - de cada um manobrar, segundo seu capricho, a vida nascente: respeitá-la ou eliminá-la. A "liberdade de manobra" não é propriamente uma forma de liberdade; é antes uma condição para ser livre. Alguém começa a ser livre quando, podendo escolher entre diversas possibilidades, - liberdade de manobra - opta por aquelas que lhe permitem desenvolver sua personalidade de modo completo - liberdade criativa. Mas uma pessoa que utilize essa liberdade de manobra contra a semente da vida, que corre aceleradamente até a plena constituição de um ser humano, estará se orientando para a plenitude de seu ser pessoal? Viver pessoalmente é viver fundando relações comunitárias, criando vínculos. Aquele que rompe vínculos fecundíssimos com a vida que nasce, destrói na raiz seu poder criador e, portanto, bloqueia seu desenvolvimento como pessoa.

 

     Tudo isto se vê claramente quando se reflete. Mas o demagogo, o tirano, o que deseja conquistar o poder pela via rápida da manipulação, age com extrema rapidez para não dar tempo de pensar e submeter à reflexão pausada cada um dos temas. Com isso não se detém nunca para matizar os conceitos e justificar o que afirma; como se houvesse um grande consenso expõe com termos ambíguos, imprecisos. Isso lhe permite a cada momento destacar dos conceitos o aspecto que interessa a seus fins. Quando realça um aspecto, o faz como se fosse o único, como se todo o alcance de um conceito se limitasse a essa vertente. Dessa forma evita que as pessoas a quem se dirige tenham elementos de juízo suficientes para esclarecer as  questões por si mesmas e fazerem uma ideia serena e bem ponderada dos problemas tratados. Ao não poder aprofundar-se numa questão, o homem está predisposto a deixar-se arrastar. É uma árvore sem raízes que qualquer vento leva, principalmente  se este sopra a favor das próprias tendências elementares. Para facilitar seu trabalho de arraste e sedução, o manipulador afaga as tendências inatas das pessoas e se esforça em obstruir seu sentido crítico.

 

     Toda forma de manipulação é uma espécie de malabarismo intelectual. Um mágico, um ilusionista faz truques surpreendentes que parecem "mágica" porque realiza movimentos muito rápidos que o público não percebe. O demagogo procede, desse mesmo modo, com estudada precipitação, a fim de que as multidões não percebam seus truques intelectuais e aceitem como possíveis as escamoteações mais inverossímeis de conceitos. Um manipulador proclama, por exemplo, às pessoas que "lhes devolveu as liberdades", mas não se detém para precisar a que tipo de liberdades se refere: se são as liberdades de manobra que podem levar a experiências de fascinação - que precipitam o homem na asfixia - ou a liberdade para serem criativos e realizar experiências de encontro, que leva ao pleno desenvolvimento da personalidade. Basta pedir a um demagogo que matize um conceito para desvirtuar suas artes hipnóticas.

 

     Na verdade, Ortega y Gasset tinha razão ao advertir: "Cuidado com os termos, que são os déspotas mais duros que a humanidade padece!". Um estudo, por sumário que seja, da linguagem nos revela que "na história as palavras são frequentemente mais poderosas que as coisas e os fatos". (M. Heidegger [3] ).

 

B)  Os esquemas mentais

 

     Do mau uso dos termos decorre uma interpretação errônea dos esquemas que articulam nossa vida mental. Quando pensamos, falamos e escrevemos, estamos sendo guiados por certos pares de termos: liberdade-norma, dentro-fora, autonomia-heteronomia... Se pensamos que estes esquemas são dilemas, de forma que devamos escolher entre um ou outro dos termos que os constituem, não poderemos realizar nenhuma atividade criativa na vida. A criatividade é sempre dual. Se penso que o que está fora de mim é diferente, distante, externo e estranho a mim, não posso colaborar com aquilo que me rodeia e anulo minha capacidade criativa em todos os níveis.

 

     Um dia uma aluna disse em classe o seguinte: "Na vida temos que escolher: ou somos livres ou aceitamos normas; ou agimos conforme o que nos vem de dentro ou conforme o que nos vem imposto de fora. Como eu quero ser livre, deixo de lado as normas". Esta jovem entendia o esquema liberdade-norma como um dilema. E assim, para ser autêntica, para agir com liberdade interior se sentia obrigada a prescindir de tudo o que lhe tinham dito de fora sobre normas morais, dogmas religiosos, práticas piedosas, etc. Com isso se afastava da moral e da religião que lhe foi dada e - o que é ainda mais grave - tornava impossível toda atividade verdadeiramente criativa.

 

     Aqui está o temível poder dos esquemas mentais. Se um manipulador lhe sugere que para ser autônomo em seu agir você deve deixar de ser heterônomo e não aceitar nenhuma norma de conduta que lhe seja proposta do exterior, diga-lhe que é verdade mas só em um caso: quando agimos de modo passivo, não criativo. Seus pais pedem que você faça algo, e você obedece forçado. Então você não age autonomamente. Mas suponhamos que você percebe o valor do que foi sugerido e o assume como próprio. Esse seu agir é ao mesmo tempo autônomo e heterônimo, porque é criativo.

 

     Quando era criança, minha mãe me dizia: "Pegue esse sanduíche e dê ao pobre que tocou a campainha". Eu resistia porque era um senhor de barba comprida e me dava medo. Minha mãe insistia: "Não é um bandido; é um necessitado. Vá lá e dê para ele". Minha mãe queria que eu me iniciasse no campo de irradiação do valor da piedade. O valor da piedade me vinha sugerido de fora, mas não imposto. Ao reagir positivamente ante esta sugestão de minha mãe fui, pouco a pouco, assumindo o valor da piedade, até que se converteu numa voz interior. Com isso, este valor deixou de estar fora de mim para converter-se no impulso interno do meu agir. Nisto consiste o processo de formação. O educador não penetra na área de imantação dos grandes valores, e nós os vamos assumindo como algo próprio, como o mais profundo e valioso de nosso ser.

 

     Agora vemos com clareza a importância decisiva dos esquemas mentais. Um especialista em revoluções e conquista de poder, Stalin, afirmou o seguinte: "De todos os monopólios de que desfruta o Estado, nenhum será tão crucial como seu monopólio sobre a definição das palavras. A arma essencial para o controle político será o dicionário". Nada mais certo, desde que vejamos os termos dentro do quadro dinâmico dos esquemas, que são o contexto em que desempenham seu papel expressivo.

 

C)  As abordagens (planteamientos) estratégicas

 

     Com os termos da linguagem se propõem (plantean) as grandes questões da vida. Devemos ter o máximo cuidado com o que se propõe (planteamientos). Se você aceita uma proposta (planteamiento), vai ter que ir para onde o levem. Desde a infância deveríamos estar acostumados a discernir quando uma proposta (planteamiento) é autêntica e quando é falsa. Nos últimos tempos as coisas estão mal colocadas (planteadas), com a finalidade estratégica de dominar o povo, temas tão graves como o divórcio, o aborto, o amor humano, a eutanásia... Quase sempre são abordados (plantean) de forma sentimental, como se apenas se tratasse de resolver problemas agudos de certas pessoas. Para comover o povo, apresentam-se cifras  exageradas de matrimônios dissolvidos, de abortos clandestinos, realizados em condições desumanas... Tais cifras são um ardil do manipulador. O Dr. B. Nathanson, diretor da maior clínica abortista dos EUA, manifestou que foi ele e sua equipe que inventaram a cifra de 800.000 abortos por ano em seu país. E ficavam surpresos ao ver que a opinião pública engolia o dado e o propagava com total ingenuidade. Hoje, convertido à defesa da vida, sente vergonha de tal fraude e recomenda vivamente que não se aceitem as cifras apresentadas para apoiar certas campanhas.

 

D)  Os procedimentos estratégicos

 

     Há diversos meios para dominar o povo sem que este repare. Vejamos um exemplo; nele eu não minto mas manipulo. Três pessoas falam mal de uma Quarta, e eu conto a esta exatamente o que me disseram, mas altero um pouco a linguagem. Em vez de dizer que tais pessoas concretas disseram isso, digo que é o pessoal que anda falando. Passo do particular ao coletivo. Com isso não só infundo medo a essa pessoa mas também angústia, que é um sentimento muito mais difuso e penoso. O medo é um temor ante algo adverso que nos enfrenta  de maneira aberta e nos permite tomar medidas. A angústia é um medo envolvente. Você não sabe a que recorrer. Onde está "o pessoal" que te atacou com maledicências? "O pessoal" é uma realidade anônima, envolvente, como neblina que nos envolve. Sentimo-nos angustiados.

 

     Tal angústia é provocada pelo fenômeno sociológico do boato, que parece ser tão poderoso quanto covarde devido a seu anonimato. "Andam dizendo tal ministro praticou um desvio de verbas". Mas quem anda dizendo? "O pessoal, ou seja, ninguém em concreto e potencialmente todos".

 

     Outra forma tortuosa, sinuosa, sub-reptícia, de vencer o povo sem preocupar-se em convencê-lo é a de repetir uma e outra vez, através dos meios de comunicação, ideias ou imagens carregadas de intenção ideológica. Não se entra em questões, não se demonstra nada, não se vai ao fundo dos problemas. Simplesmente lançam-se chavões, fazem-se afirmações contundentes, propagam-se slogans na forma de sentenças carregadas de sabedoria. Este bombardeio diário modela a opinião pública, porque as pessoas acabam tomando o que se afirma como o que todos pensam, como aquilo de que todos falam, como o que se usa, o atual, o normal, o que faz norma e se impõe.

 

     Atualmente, a força do número é determinante, já que o que é decisivo depende do número de votos. O número é algo quantitativo, não qualitativo. Daí a tendência a igualar todos os cidadãos, para que ninguém tenha poder de direção de ordem espiritual e a opinião pública possa ser modelada impunemente por quem domina os meios de comunicação. Uma das metas do demagogo é anular, de uma forma ou outra, aqueles que podem descobrir suas trapaças, seus truques de ilusionista.

 

     A redundância desinformativa tem um poder insuspeitável de criar opinião, fazer ambiente, estabelecer  um clima propício a toda classe de erros. Basta criar um clima de superficialidade no tratamento dos temas básicos da vida para tornar possível a difusão de todo tipo de falsidades. Segundo Anatole France, "uma tolice repetida por muitas bocas não deixa de ser uma tolice". Certamente, mil mentiras não fazem uma só verdade. Mas uma mentira ou uma meia verdade repetidas por um meio poderoso de comunicação se converte em uma verdade de fato, incontrovertida; chega a construir uma "crença", no sentido orteguiano de algo intocável, de base, em que se assenta a vida intelectual do homem e que não cabe discutir sem expor-se ao risco de ser desqualificado. A propaganda manipuladora tende a formar este tipo de "crenças" com vistas a ter um controle oculto da mente, da vontade e do sentimento da maioria.

 

     O grande teórico da comunicação MacLuhan cunhou a expressão:  "o meio é a mensagem"; não se diz algo porque seja verdade; toma-se como verdade porque se diz. A televisão, o rádio, a imprensa, os espetáculos de diversos tipos têm um imenso prestígio para quem os vê como uma realidade prestigiosa que se impõe a partir de um lugar inacessível para o cidadão comum. Aquele que está sabendo do que se passa nos bastidores tem algum poder de discernimento. Mas o grande público permanece fora dos centros que irradiam as mensagens. É insuspeitável o poder que implica a possibilidade de fazer-se presente nos cantos mais afastados e penetrar nos lares e falar ao ouvido de multidões de pessoas, sem levantar a voz, de modo sugestivo.

 

Antídoto contra a manipulação

 

     A prática da manipulação altera a saúde espiritual de pessoas e grupos. Eles possuem defesas naturais contra esse vírus invasor? É possível contar com algum antídoto contra a manipulação demagógica?

 

     Atualmente é impossível de fato reduzir o alcance dos meios de comunicação ou submetê-los a um controle de qualidade eficaz. Não há defesa mais confiável do que a devida  preparação por parte de cada cidadão. Tal preparação inclui três pontos básicos:

 

1)   Estar alerta, conhecer detalhadamente os ardis da manipulação.

 

2)   Pensar com rigor, saber utilizar a linguagem com precisão, propor bem as questões, desenvolve-las com lógica, não cometer saltos no vazio. Pensar com rigor é uma arte que devemos cultivar. Aquele que pensa com rigor dificilmente é manipulável. Um povo que não cultive a arte de pensar, com a precisão devida, está à mercê dos manipuladores.

 

3)    Viver criativamente. O que há de mais valioso na vida somente se pode aprender verdadeiramente quando se vive. Se você, por exemplo, promete criar um lar com outra pessoa e for fiel a essa promessa, vai aprendendo dia a dia que ser fiel não se reduz à capacidade de aguentar. Aguentar é para muros e colunas. O homem está chamado a algo mais alto, a ser criativo, ou seja: a ir criando em cada momento o que prometeu criar. A fidelidade tem um caráter criativo. Quando o manipulador de plantão diz a seu ouvido: "Chega de aguentar, procure satisfações fora do casamento, pois isso é que é imaginativo e criador", você saberá responder adequadamente: "Amigo, não estou para aguentar, mas para ser fiel, que é bem diferente". Você dirá isso porque saberá por dentro o que é a virtude da fidelidade e suas consequências.

 

A mobilização de um contra-antídoto: a confusão da vertigem com êxtase

 

     Se tomamos estas três medidas, seremos livres apesar da manipulação. Mas aqui surge um grave perigo: quem deseja dominar-nos está pondo em jogo um contra-antídoto, que consiste em confundir dois grandes processos de nossa vida: o da vertigem e o do êxtase. Se caímos nesta armadilha, perderemos definitivamente a liberdade.

 

     A vertigem é um processo espiritual que começa com a adoção de uma atitude egoísta. Se sou egoísta na vida, tendo a considerar-me como o centro do universo e a tomar tudo o que me rodeia como meio para meus fins. Quando me encontro com uma realidade - por exemplo, uma pessoa - que me atrai porque pode saciar meus apetites, me deixarei fascinar por ela. Deixar-se fascinar por uma pessoa significa deixar-se arrastar pela vontade de dominá-la para pô-la a meu serviço. Quando estou a caminho de dominar aquilo que inflama meus instintos, sinto euforia, exaltação interior. Parece que estou para obter uma rápida e comovedora plenitude pessoal. Mas essa comoção eufórica degenera imediatamente em decepção, porque, ao tomar uma realidade como objeto de domínio, não posso encontrar-me com ela, e não me desenvolvo como pessoa. Lembremos que o homem é um ser que se constitui e desenvolve através do encontro. Essa decepção profunda me produz tristeza. A tristeza sempre acompanha a consciência de não estar a caminho do desenvolvimento como pessoa. Essa tristeza, quando se repete uma e outra vez, se torna envolvente, asfixiante, angustiante. Vejo-me esvaziado de tudo o que necessito para ser plenamente homem. Ao vislumbrar esse vazio, sinto vertigem espiritual, angústia.

 

     Se o sentimento de angústia é irreversível porque não sou capaz de mudar minha atitude básica de egoísmo, a angústia dá lugar ao desespero: a consciência lúcida e amarga de que tenho todas as saídas fechadas para minha realização pessoal.

 

     Um jovem estudante um dia se esforçou em convencer uma amiga viciada em drogas  de que ela estava se destruindo. Ela o interrompeu e disse com desalento: "Não perca seu tempo. Sei perfeitamente que estou à beira do abismo. O que acontece é que não posso voltar atrás, o que é muito diferente". Esta consciência de não ter saída é o desespero. O desespero leva rapidamente à destruição, própria ou alheia, física ou moral. (Digamos entre parêntesis que este processo se refere àqueles que em perfeito estado de saúde se entregam ao afã de possuir o que deslumbra os próprios apetites, não àqueles que sofrem algum tipo de depressão por motivos fisiológicos).

 

     Resumindo: a vertigem não exige nada no princípio, promete tudo e tira tudo no final. A vertigem te enche de ilusões (ilusiones) e acaba convertendo-te num iludido.

 

     Vejamos agora o processo oposto: o do êxtase ou criatividade. Se não sou egoísta, mas generoso, não reduzo o que me rodeia a meio para meus fins. Eu sou um centro de iniciativa, mas você também o é. Por isso lhe respeito como você é e no que você está chamada a ser. Este respeito me leva a colaborar com você, não a lhe dominar. Colaborar é articular minhas possibilidades com as suas. E esta articulação é o encontro. Ao encontrar-me, desenvolvo-me como pessoa e sinto alegria. Esta alegria, em seu grau máximo, se chama entusiasmo. Entusiasma-me encontrar realidades que me oferecem tantas possibilidades de agir criativamente que me elevam ao melhor de mim mesmo. Essa elevação é o êxtase. Quando me sinto próximo à realização de minha vocação mais profunda, experimento uma grande felicidade interior. Esta felicidade me leva à construção de minha personalidade, da minha e as daqueles que se encontram comigo. Aqui está um dado decisivo: No processo de êxtase o encontro cria vida de comunidade. O processo de vertigem a destrói.

 

     O êxtase é um processo espiritual que ao princípio exige de você por inteiro, lhe promete tudo e ao final lhe dá tudo. O que é que exige no princípio? Generosidade. Você não encontrará nem uma só ação que seja criativa no esporte, na vida de relação, na vida estética ou religiosa que não tenha em sua base alguma dose de generosidade. Se você for egoísta ao praticar esporte, você reduzirá o jogo a mera competição, que é uma das formas de vertigem da ambição. Você vai tomar os companheiros de jogo como meios para seus fins. Você não construirá unidade mas dissensão, e vai gerar violência.

 

Ficam claras as consequências da vertigem e do êxtase:

 

     A vertigem anula pouco a pouco a criatividade humana - porque impossibilita o encontro, e toda forma de criatividade ocorre no homem através da construção de diversos modos de encontro -, diminui ao máximo a sensibilidade para os grandes valores, torna impossível a construção de formas elevadas de unidade.

 

     O êxtase, ao contrário, incrementa a criatividade, a sensibilidade para os grandes valores, a capacidade de unir-se de forma sólida e fecunda com as realidades ao redor.

 

     Agora podemos responder lucidamente à pergunta que deixamos pendente. Dizíamos que o tirano domina os povos reduzindo as comunidades a meras massas. Faz isso minando a capacidade criadora de cada uma das pessoas que constituem tais comunidades. Este empobrecimento das pessoas se consegue orientando-as para diversas formas de vertigem não para o êxtase. Para isso o demagogo manipulador confunde ambas as formas de experiência, e diz às pessoas, sobre tudo aos jovens: "Concedo a vocês todo tipo de liberdades para realizarem experiências exaltantes de vertigem. Essa exaltação é a verdadeira forma de entusiasmo, e conduz à felicidade e à plenitude".

 

     Se caímos nesta armadilha ardilosa, não teremos futuro como pessoas. Vertigem e êxtase são polarmente opostos em sua origem - que é a atitude de egoísmo, por um lado, e a de generosidade, por outro - e são diferentes em seus fins: A vertigem tende ao ideal de dominar e  desfrutar; o êxtase se orienta para o ideal da unidade e solidariedade. Confundir ambas as experiências significa projetar o prestígio secular das experiências que os gregos denominavam êxtase - elevação ao que há de melhor em si mesmo - sobre as experiências de vertigem e dar uma justificação aparente às práticas que conduzem o homem a formas de exaltação aniquiladora.

 

     Nossa vontade de sobrevivência como seres pessoais nos leva a perguntar se há um antídoto contra a confusão entre vertigem e êxtase. Afortunadamente, há, e se baseia na convicção de que o ideal é que decide tudo em nossa vida. Somo seres dinâmicos, devemos configurar nossa vida de acordo com um ideal; temos liberdade para assumir um ideal ou outro como meta da existência, impulso e sentido de nosso agir, mas não podemos evitar que o ideal do egoísmo e de domínio nos exalte primeiro e nos destrua ao final, e que o ideal da generosidade e de unidade nos exija no princípio um grande desprendimento e nos dê a plenitude no final. O fato de orientar a vida para este ideal plenificante nos impulsiona a escolher em cada momento o que é mais adequado para nosso verdadeiro ser. Esta liberdade interior nos imuniza em boa medida contra a manipulação.

 

A configuração de um Novo Humanismo

 

     Uma vez que recuperemos a linguagem sequestrada pelos manipuladores e ganhemos liberdade interior, podemos abordar com garantia de êxito a grande tarefa que a humanidade atual tem diante de si: dar vida a uma nova forma que assuma as melhores realizações da Idade Moderna e supere suas deficiências, as que provocaram duas hecatombes mundiais. Esta tarefa, que em linguagem religiosa está sendo chamado de "reevangelização", somente poderá levar-se a cabo se formos à raiz de nosso agir. A raiz é o ideal que nos move.

 

     Desde o período de entre guerras pede-se na Europa uma mudança no estilo de pensar, de sentir e agir. Essa mudança não se realizou, Daí o desconcerto e a apatia da sociedade contemporânea. É hora de abandonar a indecisão e lançar as bases de uma concepção de vida ponderada, mais ajustada à verdadeira condição do ser humano. Isso requer ter a valentia de optar pelo ideal da generosidade, da unidade, da solidariedade. Esse ideal - e a cultura  correspondente - tem uma antiga e prestigiosa tradição na Europa, mas, diante de épocas anteriores à nossa, apresenta-se a nós como uma novidade. Se o assumimos com garra, sem restrição alguma, veremos nossa vida cheia de alegria, pois, como bem dizia o grande Bergson, "a alegria anuncia sempre que a vida triunfou" [4] . E não há maior triunfo que o de criar modos autênticos de união pessoal.

 

     Levar a cabo esta tarefa criativa na sociedade atual depende em boa medida dos meios de comunicação. Um dia e outro, com o poder de persuasão exercido pela insistência, os meios abrem ante o homem atual duas vias opostas: a via da criatividade e a edificação cabal da personalidade, e a via da fascinação e o desmoronamento da vida pessoal. Quando se fala de manipulação, se alude a uma forma de abuso dos meios de comunicação que tendem a encaminhar as pessoas por uma via destrutiva.

 

     Cabe, no entanto, outra forma de uso que assuma todas as possibilidades de tais meios e lhes confira uma profunda nobreza e uma grande fecundidade. Somente quando as pessoas se orientem por esta via terão garantido sua liberdade no seio dos regimes democráticos, que - é bom lembrar- não geram liberdade interior automaticamente.

 

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1. Este trabalho servirá de Introdução a um curso que o autor dará em breve na Internet do Vaticano (Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais) com esse mesmo título.

 

2. Sobre este conceito de "ideologia" pode-se ver meu trabalho "Conhecer, sentir, querer. A propósito do tema das ideologias", em Hacia un estilo de pensar I. Estética. Edit. Nacional, Madrid 1967, págs. 39-96.

 

3. Cf. Nietzsche I, Neske, Pfullingem 1961, p. 400.

 

4. Cf. L'energie spirituelle, PUF, París 32 1944, p. 23

 

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